Falando a verdade, trabalhar em tão exaustiva e ingrata função naquele restaurante fora, no começo, um dos piores dramas na vida do personagem. De nome, Omar. Carregava frutos do mar, o cheiro disso também carregava nas costas, que inclusive era mais pesado que os frutos em si. Era um menino Omar de meia idade, cabelos ralos e pouca conversa e muitas chacotas. Contra o próprio. Antes dos peixes, a própria química corporal traíra o infeliz em várias, e todas, em todas várias vezes que já tentou aproximar-se de mulher. Traçou esta meta para si mesmo desde muito novo; menino, apaixonou-se por uma e fez questão de lhe esquecer o nome depois do que ocorreu. Nada ou muito pouco foi sabido do fato. Do pouco, houveram gritos, alguém comentara de uma menina, futum, asfixia e dum moleque bem ligeiro desaparecer correndo pelas ruas de baixo. Dali, foram todos insucessos e vários. Tratou logo de abandonar sua mãe, seu pai, sua avó, sua irmã que sempre dirigiam para ele sons nasais; até o cachorrinho da família, um branco, pequeno, fingia ter um gato no quintal e fugia das carícias do Omar. Logo o cachorrinho ocioso que nunca saía do canto pra nada. Vieram as obrigações de indivíduo moderno e montada vinha também a necessidade de trabalhar. Eis que aqui o vemos. Carregando frutos do mar, o Omar. Sem esquecer do que era, tentou cozinheiras, garçonetes, tentou até um garçom cabeludo depois de meia garrafa duma bebida importada solta em uma mesa vazia; voltou sangrando pelo nariz, envergonhado com o equívoco. Ser contrário era tão essencial para o homem que não havia nem banho, nem reza que aliviasse; e agora tinha também o cheiro dos frutos do mar, Omar! Neste exato momento em que carrega alguns quilos do mais requintado salmão, estático, ele morre por dentro. Morre Omar, o galã mal-cheiroso e fracassado. Com os seus botões, tão subestimados mas muito rápidos, raciocinou durante exatos seis segundos enquanto baixava para apanhar o seu fardo e soltou: Morri! Não gritou nem disse isso com o seu mal-hálito sempre evitado; apenas pensou. Não importavam, não o fariam nunca mais as mulheres. Esqueceu disso e morreu. Dali deixa que os peixes caiam no chão, escolhe o cutelo mais brilhante que vê por cima da louça suja, começa a espalhar o seu cheiro e dor pela cozinha, derruba uma primeira cozinheira sem mesmo grito, parte para a segunda com o mesmo cutelo ocultado pelos sons de fora, terceira e já passa a gostar do ofício, esconde o cutelo atrás de si, grita pelo garçom cabeludo, espera-o atrás duma porta de dobradiças, surpreende e retalha o nariz do moço, encara o rapaz barulhento em meio ao sangue e peixe, golpeia novamente eliminando-o. Tudo o que podia parecer cômico na vida do Omar ali ele deixou, quando saiu pelos fundos empunhando o cutelo, cheirando mal como nunca havia cheirado antes e aos berros, rodeado por moscas, gritou muito alto que havia ressucitado.
Luiz Victor
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