quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Tanajuras

Eu era feliz quando um coaxar cessava na pressão de meus dedos ou um bater de asas se via sem asas, ou um miado extirpava lamúrias de idosas solitárias.
Eu era feliz quando entendia o que é ser o Deus dos humanos, num laboratório simplificado onde fui onipotente, onisciente de uma sabedoria previsível e onipresente com agulhas e dedos.
Eu era feliz quando sabia como Deus não sente remorso.
Eu era feliz quando ninguém orientava meus desejos e, solto na natureza cercada, alimentava meus instintos.
Eu era feliz quando o couro animal ardia e seus lamentos indecifráveis ecoavam no quintal.

Como muito que morre na infância
Não morreu
Como maioria que se deixa pra trás
Não deixou

Mas eu deixei de ser feliz porque crescemos
E deliberadamente estou errado aos outros olhos
Minha profissão de Deus não cansava nem um pouco
Porém, cresci, e sua importância implodiu.

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Hoje choveu como não chovia há tempos.
Estou só no meu quarto, pela janela entraram muitos insetos
Gargalho disposto, pois acabo de descobrir que ainda sou feliz.

2 comentários:

Márcia de Albuquerque Alves disse...

Lindo! ahhhhh me deu uma sensação boa de passado kkkk

Anônimo disse...

A gente fica ocupado de mais pra ficar triste. A gente acha que felicidade é esse 'não-ser', porque é nesse 'não-ser' que cabe o 'ser feliz'.